sexta-feira, 16 de abril de 2010

Contra o Estereótipo (ou Um Senhor Terceiro Lugar)




Ainda ontem eu conversava com uma jornalista sobre o lance gostoso e urbano do “terceiro lugar”. Até brinquei, falando que é como se meu apartamento fosse meu quarto, e o bairro fosse o resto da casa, só que com várias salas de estar. Percebi que um terceiro lugar não precisa ser um café exatamente, mas um bairro inteiro, algumas vezes. Então, quis mostrar um pouquinho do meu, num texto pequeno à guisa de crônica (não que eu me considere cronista como meus ídolos de infância e adolescência, mas estou com saudades de ler textos assim). Então peguei esse textinho em que falei para umas pessoas de longe de como estavam erradas sobre o que achavam do lugar em que moro.



Meu bairro tem céu azul. Muito azul! Nele, periquitos em bando fazem a maior algazarra, brincando o tempo todo, soltos. Bem-te-vis e sabiás pulam pelos canteiros e calçadas, os últimos com cara de bravos (não sei o porquê, mas sempre achei que sabiá tem cara de bravo, mas é lindo assim mesmo).

Em meu bairro, o moço da banca de revista, a moça do café, o cara da padaria e o vigia noturno conhecem as pessoas pelo nome. As pessoas e os cachorros, que parecem não ser só de seus donos, mas mascotes da rua toda. E haja cafuné! Em meu bairro há um supermercado bonito e tranqüilo, que recebe luz natural, assim como recebe bem os clientes com música suave (dia desses fui recebido ao som de Norah Jones... funcionou... eu ia comprar lenço de papel e saí com o jantar todo de uma vez).

Aqui no bairro há senhoras (orientais ou não) fazendo tai-chi na manhã fresca e ensolarada, sob um céu azul que vem te dar bom dia. Depois, tomam água de coco aberto na hora, animadas, pondo a conversa em dia (durante o tai-chi é silêncio mesmo). Em meu bairro, podemos caminhar de dia e à noite, ainda tranquilos. Há vilas com sobradinhos coloridos e floridos, com o cachorro brincando na garagem ou o gato espreguiçando-se ao sol em cima do muro.

Sim, em meu bairro ainda há pracinhas com grandes árvores, sob as quais crianças brincam nos playgrounds. Há jovens jogando vôlei nas quadras, suando e rindo. Há feiras no meio da rua, naquele velho estilo de “mulher bonita não paga, mas também não leva”. Com pastel, caldo de cana e tudo. Há gente bonita indo para o trabalho com a sacolinha de papel com pão de queijo e copinho de isopor com café para viagem. Há o rapaz da bicicleta com uma cesta de pães na frente, com sua buzina de borracha chamando lá dentro de casa gente que quer pão quentinho para o café e vem pegá-lo na calçada, de roupão e chinelo.

A propósito, este meu bairro fica na maior cidade do país, famosa por só ter concreto, asfalto, poluição, violência e barulho. E isso não é no subúrbio. É a cinco minutos do centro. Em parte, é verdade que essas coisas lamentáveis existem. Também. Não muito aqui no bairro, felizmente.

Mas erra quem acha que é só isso. Ignorantemente.

Um comentário:

Nós disse...

Esse pastel e caldo de cana...
Em sua homenagem, tomarei um amanhã e comerei um pastel de queijo.
Embora sem metade do charme do seu...